sábado, 14 de janeiro de 2017

A Arte de Escrever

É fácil desmascarar certos impostores pela forma como escrevem. Schopenhauer já nos alertou sobre isso nos textos publicados no Brasil sob o título A Arte de Escrever. Para não me estender demais, vou aqui apenas dar um exemplo.

Bom escritor:

O céu é azul.

Mau escritor:

A abóbada que nos recobre o vasto mundo, desde o nascente até o poente e passando por todas as áreas habitadas ou não, é de tal forma ampla que poderíamos levar toda a vida a percorrê-la, sem ainda nos dar conta de sua real extensão - tal é o chamado céu, cuja cor à primeira vista pode parecer óbvia, contudo suas nuances são várias, tênues e delicadas, mudando conforme a estação e o horário do dia, e ainda assim há um tom predominante, ou pelo menos é o que nosso imperfeito aparato sensorial nos permite supor, e mesmo aqui haverá sempre espaço para interpretações diferentes e difusas, pois a variedade da experiência humana nos leva a crer que tudo é relativo, que somos todos diferentes, embora iguais, ou nem mesmo iguais, mas apenas diferentes, assim a cor que vemos pode não ser a mesma que veem nossos irmãos, ou os povos de outros continentes, ou quem sabe a cor é a mesma, mas as palavras para defini-las variam, ou sendo as cores diferentes, convencionou-se usar os mesmos nomes às vezes por mero hábito de imitação, outras vezes por violenta imposição, de tal forma que nem mesmo os povos mais isolados e puros - se é que tal adjetivo pode ser usado - estarão livres da dúvida sobre a origem dos termos que usam, se são mesmo seus ou se pertencem a outrém, e é por isso que não podemos jamais estar certos da cor exata a que nos referimos quando queremos falar sobre a cor que vemos todos os dias, ou quase todos, pois há também os dias chuvosos e os de nevasca, os nublados e os pálidos, isso sem falar no nosso próprio estado de espírito, onde a melancolia mais profunda acentua os tons sombrios, modificando o matiz para o lado negativo, inferior ou maligno do espectro, e igualmente a alegria, a excitação e o otimismo acentuam os tons claros, forçando os matizes positivos, superiores ou benignos; desta forma... do que é que estávamos falando mesmo?

PS: Tirando o lapso de honestidade da última pegunta, o resto dá uma ideia clara do tipo de escritores a que me refiro. Infelizmente esse tipo parece dominar nossas universidades, dando dor de cabeça aos estudantes quando deveriam dar-lhes educação. Voltarei a esse assunto tratando dos tipos de falácia que tenho visto (além da prolixidade, claro).

Acharam o exemplo exagerado? Leiam Schopenhauer, que já denunciava esses tipos há mais de 150 anos.

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